sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Caducas

A tinta está descascando. Acharam melhor me levar ao restaurador e, de sobra, me deram uma porção contra as traças para beber. Acontece que minhas idéias estruturadas no respeito estão enquadradas na velhice, uma tela enquadrada na parede: um imóvel a mercê de cupineiros a ponto de ser comido vivo. Estão ficando caducas. De bengaladas em bengaladas, elas se digladiam e voltam ao ponto de sempre... e nesse esquizo, estão me levando junto à loucura, mas, ainda assim, espero definhar com elas.

sábado, 16 de outubro de 2010

De fogaréu

Madrepérola

Ela escolheu cintilar meus olhos, me propôs olhá-la a cada vez que passasse e, desse modo, chamuscá-los em faíscas brancas. Decidi não concordar e foi numa venda preta que eu me ceguei em três nós cegos: para ela e todas as outras. Mas o canto da (quela) sereia se alojou na minha loucura e, num vendaval de uma venda preta, meus olhos negros cintilaram. Não foi preciso proposta alguma, o tempo coube de valorizá-la dentro de mim.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Como o amor te vê?

Comove
Como move como vento
Comovente
O amor tem pena de mim.

A moça das maçãs


Maquiando os problemas à base de corretivo cor-de-pele, tu vais fazendo homens se entreter, rir e dançar à penumbra de becos úmidos. Menina esquecida, és mulher frustrada e futura senhora ao Deus dará: nas tuas mãos há uma maçã, um favor pecaminoso e o corromper da carne. O mundo é teu e, desse modo, procura nele a liberdade e continua presa ao teu próprio ser, vais pensando em absurdos perambulando até danar a mente e, feito cego às escuras, vai tateando. Teus amáveis ossos de quase três décadas não se deduzem à frente do espelho, só há carne, rugas e nada pra contar. Tripudie, Amanda! A vida ainda é bela, não é preciso amor para viver. (...)

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Pandora

Sou presente dado
Não rejeitado, sou todo ouvido
Sou calado, embolado, coagido

Sou presente dado
De Hermes, de Deus, presente da Grécia
Sou Pandora, sou caixa, sou castigo

Sou presente dado
Mate-Mateus, mate a matemática!
Sou foto, sou arte e nordestino

Sou presente dado
Não confiável, pensativo
Sou homem-bomba, mudo e sem perigo

Sou presente dado
Transitivo, transitório, transigente
Sou inconsequente e, ainda assim, protegido

A garota de um olho só

Ela ainda os tinha. Eram grandes e repletos de cílios. Eram ávidos: o direito, pelas belezas, pelo sorrir. Já o esquerdo, entretanto, mirava a doença e o ácido que te corrói aos sete palmos do chão. Os olhos novos mofam e ela, coitada, perdeu um pros ácaros. O direito. Eu, que não queria ver a vala na face dela, lhe dei o meu.
- Àquela garota, meu olho direito, pensei.
Dei. E, hesitando por pensar em perder de novo, ela aceitou. O fato é que ela estava certa. Agora somos duas valas repletas de engano.