Já alvorecia quando ele começou a sentir contra o peito as ondas do uísque barato que estava abrigado sob paletó que se debatiam nos ritmos de cada passo. Já não lembrava em qual taberna tinha entrado e sorvido meia garrafa de dó, mas lembrava que foi nela que, na porta de entrada, cruzara com uma moça de sorriso mudo.
- São três da manhã, os sorrisos já não são mais permitidos. Pensava, quando não se podia fazer mais nada.
Tracejava em mente as maçãs do rosto dela, o olho apertado, as alças caídas e misturadas ao cabelo desmantelado. Já não era sem tempo de pôr alguém na vontade, mas ele achava que voltar era desesperadamente infrutuoso.
- Ela devia saber que, às três da manhã, para vulnerar alguém, basta-lhe sorrir. A madrugada é para o dissabor: já não há tempo para as angústias na correria matinal.
O sentimento de ser tapeado perdurou até as luzes da cidade se apagar. Um escuro ministrado somente pela luz refletida nas nuvens que anunciavam o devir do sol. As pessoas não passavam de sombras sem rostos e os movimentos eram denunciados pelos sons dos encalços. Ele acompanhou um poste e, disfarçadamente, deu meia volta enquanto tateava-o na sua circunferência. Voltou três quadras em passos de gatuno cambaleante e começou a se enfiar em todas as tabernas suspeitas. Voltou mais algumas quadras e, repentinamente, surgiram sorridentes numa manhã, começando, assim, a embaralhar tudo. Foi a um café, sorveu uma xícara com talos de canela e, ao sair, ironicamente, se cruzou com uma moça de choro libertino.
gostei de como você escreve, estou seguindo vc para ter oportunidade de ler mais o que escreves. bjs
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